Nem sei como é que, no meio do tabu que está subjacente à
revelação do autor ou dos autores do crime da rua dos Correeiros que vos tenho
vindo a contar, numa novela de faca e alguidar e alguma comida de fazer crescer
água na boca a mim próprio, se bem que alguns leitores também confessem que não
são avessos aos prazeres da mesa e de alguns vinhos de estalo, desde os brancos
alentejanos e da península de Setúbal ou mesmo da região oeste, até aos tintos
mais apreciados por este escriba que passam pela Granja da Amareleja, por
Monsaraz ou por Borba, não descurando os de Pegões, os de Alcoentre e um ou
outro Douro reserva ou garrafeira, passando pelos verdes da sub-região do Lima,
onde pontificam Alvarinhos e Loureiros brancos e o belíssimo vinhão de Aguiã,
me fui lembrar de uma conversa entre os jovens que nós éramos, naquela época
ainda sem os nossos vinte anos feitos, mas que gostávamos de, com uma bica na mesa,
duas baforadas de cigarro, alguns copos de água e muitas sebentas em cima da
mesa, aproveitar as horas mortas da taberna do meu amigo Ismael para estudarmos
um bocado e, as mais das vezes, para ficarmos realmente à conversa.
Calculo que, para quem segue novela que se intitulará
provisoriamente “O inexplicável crime à beira de uma travessa de carapaus
alimados” e pouco ligados ao “Conto das ilhas de lá”, apesar da sua carga
erótica, misteriosas e polvilhada de vocábulos que não dispensam a presença de
Houaiss a mostrarem que o autor, perdão a autora, a nossa bem conhecida
Francisca, é uma pessoa erudita que, se escreve um ou outro vocábulo a roçar o
calão, isso é apenas porque os personagens não passam de uns sem-vergonhas,
pode-se mesmo dizer de uns pelintras de conhecimento linguístico que a riqueza
do luso idioma enclausura, pouco se lhe importa que no meio de tudo isto,
Constantino continue a contar histórias que se passaram na taberna de um amigo
seu, galego de nascimento, lisboeta por opção, benfiquista de coração, um amigo
também ao vosso dispor, Ismael de sua graça. Mas tenham paciência, bem sei que
sem sangue não se faz arroz de cabidela, mas contos menos dramáticos,
acompanhados a café e a bolos de arroz, vá lá, a queques de laranja, também têm
o seu lugar, mesmo que seja na mesma mesa onde já se comeu o belo paio de porco
preto, umas amêijoas à Bulhão Pato, um bacalhau à Zé do Pipo ou um queijo de
Serpa, DOP com pão de forno de lenha.
Pois para que não se perca mais tempo, vou já direto ao
assunto, repitam comigo pois já o sabem de cor, como é apanágio aqui do vosso
amigo Constantino. As férias de alguns de nós, eu excluído, pois nesse tempo
andava a vender livros pelos refeitórios das empresas, durante as minhas férias
de verão, mas é história para vos contar noutra altura, tinham sido no Algarve,
alguns dos quais na região de Lagos. Lagos é e continua a ser um destino de
férias muito bonito, um destino balnear de excelência e, pena é, que muitos de
nós não tenha subsídio de férias para gastar. Lagos tem praias típicas, todas
rodeadas de rochas mas, naquele tempo,
algumas só acessíveis através de escadarias escavadas na falésia que se
permitiam descer ou escalar agarrados a cabos de aço forrados a borracha. Estas
eram as praias-tipo para a proibidíssima prática de nudismo mas que dava muito
trabalho aos cabos de mar, descer e subir aquelas escarpas só para irem
pespegar multas aos naturistas, ainda por cima fardados a rigor. Ora, na nossa
idade, a curiosidade alia-se à aventura e houve quem de nós se dedicasse também
a tão pura, quanto saudável, prática. Saudável pensávamos nós sem a devida
proteção e se o Paiva se queixava que tinha os genitais a arder, que lhe doía
tudo, em linguagem mais vernácula própria da irreverência juvenil se dizia por
claro o “coiso” e se chamavam tomates aos testículos, já o Oliveira, sem saber
do que se falava na tertúlia, irrompe porta dentro, perna aberta quase sem
poder andar, dirige-se à mesa onde nos encontrávamos uns seis ou sete curiosos,
ávidos daquelas histórias para nós surpreendentes ou surreais, a desabafar alto
e bom som «porra que estou à rasca do cú!». Claro que ele veio depois a saber
porque é que em uníssono desatamos todos à gargalhada.
E, então?
ResponderEliminarLá vens tu com muita parra e pouca uva...:)
Esqueceste o meu vinho verde branco Ponte de Lima Adamado ou Casal Garcia!
Beijocas.
Bom fim de semana.
Adamado é mesmo só para as damas. Eu gosto mais do vinhão. Coisa de macho :) LOL
EliminarBeijocas.
Essa prática do naturismo não era assim tão saudável, não, para quem adormecia ao sol, sem protetor solar. E, naquele tempo, tirando o nivea da caixa azul com se que besuntavam os putos, rapaz que fosse rapaz ou já homenzinho não queria saber dessas "mariquices". E pagava-se caro, a brincadeira... :)))
ResponderEliminarBeijocas!
E ás vezes ainda se exagerava com uns bronzeadores que faziam fritar a pele.
EliminarBeijoca.
Começaste pelo desfile daqueles maduros da tua região, passaste ao Alentejo e ao Douro (dispenso os verdes...).
ResponderEliminarDepois apareceu (hummm...) um queijo de Serpa!!
O que valeu é que eu tinha passado pela padaria e levava pão para casa e fiz um óptimo lanche!
Agora vou reler o resto da intriga.
Um abração.
Se conseguires perceber avisa :)
EliminarAbraço!
Desatando a gargalhadas sempre estou eu quando venho aqui sr.Vitor
ResponderEliminarEssa prática de falar em delícias da cozinha certamente é pra deixar mesmo o leitor com fome ... e sobre as belezas já estiva lendo sobre o turismo em Portugal e fiquei apaixonada por essa regiao do Algarve, praias paradisíacas(?)nenhum nudismo me parece, tem Porto de Mós,com areias claras,mar turquesa e rodeada de falésias. Tem tbem a rota do vinho ...e ainda o caldinho de cebolas e sardinhas.Tudo perfeito mas só se levar muita 'grana'porque está tudo pela hora da morte... não é?e ainda um mar imenso até chegar lá rs
Muito boa a leitura Vitor, me divirto , voce é ótimo.
abraços
* sobre seu comentário: no dia que fotografei ,o mar não estava em ressaca, alguma marola dos muitos barcos a motor aproveitando o dia ensolarado.Um dia lindo!
bom que voce gostou!
Eu, passeante por tudo o que é terra com praia, abaixo de Peniche (acima, a temperatura da água é uma chatice), este ano não escolho Lagos. Manta Rota, lá para meados de Julho (será que ainda venho à tasca depois isso?)
ResponderEliminarVinho, verde, branco, mas Casal Garcia não porque leva poucas uvas ;) (é martelado de forma industrial) acreditei porque sei quem o faz...
ResponderEliminarE que tal "O inexplicável crime junto à travessa" é mais pequeno e a palavra travessa deixa a dúvida se se trata de uma travessa de servir ou uma travessa (rua) e só ao longo da leitura os leitores percebem ao que se refere, acho mais entusiasmante para o leitor...*