No seio familiar não houve surpresas. A minha mãe disse-me
que já estava à espera, pois já era um hábito de família. E relembrava-me que o
meu irmão Leopoldo, deste há muitos anos, escreve programas de computador e que
o meu mano Paulinho escreveu já uma tese de mestrado, outra de doutoramento e
passa o tempo a escrever artigos em revistas. Já para não falar nos teus filhos, rematou. Só me faltou dizer que
eu saio a eles, logo eu que sou o mais velho. O meu pai quis também saber do
que é que tratava o livro, mas quando lhe comecei a explicar e depois de ter
voltado ao princípio duas vezes, ele achou tão complicado que me contou a
anedota da moça que quando recebia aerogramas escritos pelo namorado, no tempo
da guerra, os levava ao farmacêutico para decifrar. O meu pai aproveita quase
todos os ensejos para dizer uma graça. Acho que ele tem a quem sair. Adiante.
Depois falamos de coisas mais práticas, eles quiseram saber
quando é que sai o livro, quanto é que vai custar, se eu já tenho muitas
encomendas e tal e foi aqui que surgiu a confusão toda. Expliquei-lhes que isto
não era bem um livro, nem tão pouco eu próprio sabia se não seria um abuso
estar a chamar-lhe livro, pois não é de papel (tenho de fazer um parêntesis
para vos dizer que descortinei neste preciso momento o primeiro sinal de
admiração pois, que eles saibam, livro é mesmo papel e não há cá nem fun-funs,
nem gaitinhas), é escrito na internet e que só quem tem esta ligação é que me
pode ler. Talvez se algum dia vier a ser publicado, aí sim, poder-se-á vir a chamar
livro, mas haverá sempre quem diga que, como livro, o melhor era eu ter ficado
quieto e não se falava mais nisso, mas nós já sabemos como cruel é a crítica.
Pelo sim, pelo não, lá me foram dizendo para quando eu fosse lá a casa com a
tal internet, lhe lesse umas paginazitas para verem se eu tinha jeito para a
coisa. Depois despedi-me, com um beijo, da minha mãe, que ficou com uma lágrima
no olho, cheia de pena da Isabella e que ainda me perguntou porque é que deram
logo sete facadas à rapariga, que isso não se
faz, não há direito, palavras dela. E saí com o meu pai.
O meu pai, pôs-me um braço por cima do ombro, caminhamos no
corredor direitos à porta, descemos as escadas lado a lado e, já na rua, suspirou-me,
com que então escritor! Eu corei um
pouco, porque sou modesto e aproveitei para lhe pedir desculpa por naquele dia,
quando eu andava na escola primária, em que ele me ofereceu a minha primeira
caneta de tinta permanente eu tê-la deixado roubar. Pela primeira vez ele
confessou que nunca se tinha importado com isso pois sempre pensou que eu viria
a ser jogador de futebol. Como estávamos longe da taberna do Ismael, entramos
no café lá do bairro e fomos beber dois abafadinhos. Quando me vim embora ainda
me perguntou, mas sete facadas porquê?
Preocupações de pais e realmente as sete facadas foram demais...mas oxalá consigas publicar em papel para que eles e nós sintamos mais orgulho no já existente como teus leitores:)
ResponderEliminarPus a leitura em dia e já não tenho adjectivos para aplicar e só espero que nunca desistas.
Isto das relações familiares é complicado! E depois não se sabe quem sai a quem!
ResponderEliminarMas acho bem isso do livro, mesmo sendo um livro a brincar, porque os verdadeiros têm folhas, feitas de árvores e tal...
(A propósito, quem é que deu sete facadas a quem?)
Hummm... afinal ele interessou-se!!
ResponderEliminarE qual é o pai que não tem curiosidade em saber o que o filho vai fazendo?!
o numero sete pode querer dizer uma infinidade de coisas, eu própria escrevi um texto que se intitula 7 e acho que pode ter várias interpretações.
ResponderEliminarmas 7 facadas?? não será demais?! (brinco, claro)
o texto está uma delicia.
um beij
Há uns tempos reencontrei a minha primeira caneta de tinta permanente. Velhinha. Daquelas que tinham um depósito para encher, sugando a tinta do tinteiro. Lembrei-me de como tinha ficado orgulhosa com ela. Foi na primeira classe e significava que eu já podia escrever sem ser só a lápis...
ResponderEliminarE é verdade... porquê sete facadas? :))
Ai as re(a)lações familiares...
ResponderEliminarNão sei se é por (ainda) ser Carnaval, mas hoje estou farta de me rir na blogosfera! E este teu texto não fica atrás (nem o anterior, note-se!) do sentido de humor generalizado! :)))
ResponderEliminarE fico a pensar com os meus botões se os pais da tia Agatha, da tia Ruth, do tio Rex, do tio Erle e por aí adiante faziam perguntas incómodas dessas... :D
Claro que todos queremos saber, não só porque foram sete, mas whodunit! Portanto, mãos à obra... :)
Beijocas!
Há tanto tempo que me habituei às sete facadas desferidas sem dó nem piedade, sabe-se lá porque energúmeno, na desventurada Isabella, que já nem me interrogo porque motivo foram sete e não seis ou cinco.
ResponderEliminarSe calhar nunca o saberemos.
Também para quê? Agora já não adianta chorar sobre leite derramado! Ou será que adianta?
Na volta ainda tudo não passou de um mal entendido do historiador e a bela corista aparece vivinha da silva...
Ahh, isso sim, iria tirar todas as ralações que ensombram o orgulho que existe no seio da família!!
Que tal se formassemos uma corrente solidária entre todos os leitores? Boa!
Beijinhos e abraços.
Olá, Constantino!
ResponderEliminarPois é; a mãe não apreciou nada ter decretado a morte da rapariga, e logo à facada, e livro é coisa só mesmo em papel.
Ainda assim o pai está todo vaidoso, pois já sabe que o filho há-de fazer boa figura, e isso percebe-se nessa cumplicidade boa.
Em papel ou noutra coisa, que saia lá esse livro, e boa sorte.
Um abraço.
Vitor
Tão gostosa esta leitura. Dinâmica. Quase como assistir novela, que o cenário vai mudando.
ResponderEliminarEu fecho com a Juanita! Aliás, tá me parecendo que você assiste novela brasileira, Vítor Fernandes? De repente tu te inspiras em alguma, e de uma hora para outra, quando menos se espera, eis Isabellita vivinha da Silva Braga Orleans Bourbon e Bragança de Melo (tem que ter sobrenomes assim reais, históricos, "Silva" é coisa de gente desimportante, menos o Presidente Lula da Silva)...
ResponderEliminar;)
P.S.
Sim, mas logo sete facadas? Fiquei com pena da moça.