Conheci-o há muitos anos já ele, para mim claro está, era um tipo entrado na idade. Eu era, portanto, muito mais jovem, uns bons trinta e tal anos mais novo. Por isso a minha deferência com ele, obrigava-me a tratá-lo por Sr. Máximo. Teria, não sei bem, os meus sete anos e meio quando o meu pai, parece que ainda lhe oiço as palavras, me disse, vais conhecer a pessoa mais espetacular que alguma vez virás a conhecer. E foi verdade. O Sr. Máximo, ninguém sabe se era nome ou se era alcunha, ninguém sabia de onde tinha vindo, ninguém lhe conhecia família, não se lhe sabia a idade, não era apenas uma pessoa bondosa. Era uma pessoa eloquente. E tocava sanfona e tinha uma grafonola. Era aquela pessoa que gostávamos de ver, sentado na mesa do café, sempre com um café por beber (ele esquecia-se com frequência e só descobria quando a chávena já estava fria), rodeada de amigos, contando histórias, dando uma boa gargalhada. Nunca fumou um cigarro mas, sempre que um dos amigos fumava junto, não barafustava, não fazia gestos de desagrado. Por vezes, já depois do outro ter saciado o seu vício recomendava-lhe que parasse. Mas sem uma crítica, sem nenhum azedume. Colecionava conchas e tinha bichos da seda. Casou cedo, mas infelizmente o seu casamento não durou o tempo que ele previa. Tratava a mulher como princesa, ninguém lhe conheceu um arrufo. Aliás, antes pelo contrário, as amigas da mulher, com quem esta confidenciava, tinham inveja de não terem arranjado um marido assim. A doença, levou-a ainda nova e ele jurou honrar-lhe a memória nunca mais casando. Todas as manhãs havia uma rosa vermelha fresca, acabada de podar, que ele colocava na sua sepultura. O Sr. Máximo, assim lhe chamei até ao dia em que naturalmente veio a falecer, não bebia, mas era alegre. Nos bailaricos da coletividade, já eu ia nos meus dezassete anos e o Sr. Máximo nos seus cinquenta, dançava como qualquer jovem. As senhoras, solteiras, viúvas ou separadas quase que faziam fila para dançarem com ele e as casadas, todos temos a certeza, morriam de ciúme. Nas pausas para o bufett, pagava chocolates e laranjadas a todas. Algumas preferiam gasosa, outras um chá. Quanto a cultura, parecia-me um daqueles sábios de antanho. Conhecia os filósofos da antiguidade e os modernos. Um dia vi-o dar uma lição de história ateniense absolutamente fantástica. Conhecia a mitologia grega e a romana, comparada. Dava explicações de matemática gratuitas aos filhos dos seus amigos e, de religião, ele que nunca professou nenhuma, era como se fosse um sacerdote. Ou um pastor. Ou um imã, um rabino, um ayatollah, um cádi, um califa, um lama. Morreu há três meses, vítima de uma pneumonia, calculamos que com os seus quase (ou talvez mais) noventas anos. Do Sr. Máximo ninguém sabia quando nasceu, nem de onde era. Isso complicou tudo quando os amigos, numa última homenagem, lhe mandaram fazer a lápide. Colocar o quê? Apenas o único nome conhecido, sem data nem local de nascimento, não poderia ser. Optaram por lhe deixar apenas uma frase. Simpática, creio eu.” Aqui jaz, aquele que não bebia, não fumava, não discutia com ninguém, que tinha sempre uma palavra amiga, que era o melhor dos amigos que se pode ter…”. E como ele era a pessoa mais bem-humorada que alguém poderia conhecer, acrescentaram “ … e que nunca falou mal da sogra”. E assim ficou gravado no mármore da sua lápide. No outro dia, junto à campa dele, reparei que quem passava e lia o epitáfio, não evitava comentar, este fulano era o máximo.
...e o teu conto está o MÁXIMO(sensível).
ResponderEliminarBela e delicada, a tua foto.
Bjs.
Não é com frequência que podemos dizer: “...este fulano é/era o máximo.” Também não é com frequência que encontramos alguém que tenha tantas estórias interessantes para contar como o Vitor.
ResponderEliminarVoce também é o MÁXIMO Vitor assim mesmo grafado em maiúsculas.
ResponderEliminarMorri de rir sozinha aqui com esse final ... kkkk
sua perspicácia é invejável.Adorei.
Parabéns.
sutilmente vou roubar esse botão de rosas( não é pra nenhuma lápide, por favor! ) rsrs
abraços de domingo
Mais um conto delicioso.
ResponderEliminarO meu amigo é o máximo. loool
Eu, como genro, também nunca falei mal da minha sogra. Se eu fosse nora, talvez o caso mudasse de figura.
ResponderEliminarlolololololololololololol.
Sabes Constantino revi-me neste teu texto, porque apesar de fumar, tento nunca incomodar ninguém, sou brincalhona, sorridente daí que, sempre que estou num café vão-se chegando e às tantas há uma roda de vizinhos e até de pessoas que só conheço do café. Trocam-se ideias, fala-se de tudo um pouco - menos de desgraças - claro que não tenho a cultura do teu Máximo, mas interesso-me por tudo e assim por vezes ficamos tempões... mas se me perguntares onde moram (excepto os vizinhos mesmo), o que fazem...não sei dizer.
ResponderEliminarÉ com tantos "Máximos(as)" que devemos aprender a valorizar a vida, porque tem coisas negativas e positivas e marinar nas primeiras é perca de tempo!
Só não quero lápide mas cremação e as cinzas jogadas fora:)
Adorei! Mais uma para a colecção e ler às netas:)
Bom domingo
O sr Máximo era realmente o máximo.
ResponderEliminarÉ pena que o Sr. Máximo já não exista!
ResponderEliminarO mundo precisava de gente assim.
Esta história tem o seu não sei o quê de comovente: pena não existirem mais homens assim! Que são o máximo! :)
ResponderEliminarBeijocas!
A vida é magia e encanto.. é preciso preservar a beleza dos nossos corações.
ResponderEliminarSaber olhar com pureza de alma respirar como se nascêssemos a cada instante!
A felicidade e a Magia é algo, que entra em nossas vidas, com total explêndor.
Hoje sinto que renasci novamente estou muito feliz por isso
estou aqui .
Carinhosamente convido você a ler a postagem do meu blog.
Aquilo que pode parecer pouco para muitos
para mim é tudo de bom que poderia acontecer nessa fase
da minha vida.
Gostaria muito de ler seu comentário no meu blog.
Uma linda semana beijos.
Evanir(EVA)
O texto, além do mais, pôe-nos a reflectir no que nos falta para merecer um epitáfio assim.
ResponderEliminarMas não tenho pena de não ser o Máximo...
@Rogério, vamos cá ver se eu entendi, a sua afirmação não tem nada a ver com essa coisa de falar mal da sogra, pois não ? :)
ResponderEliminarMuito eu teria gostado de conhecer o Sr. Máximo! Ainda que ele fumasse e bebesse o seu copito, penso que não deixaria de ser o máximo, já que tantas eram as suas qualidades.
ResponderEliminarSabe uma coisa Vitor?
Conheci,(ao vivo e a cores)recentemente, alguém que me fez lembrar o Máximo.
Não toca sanfona e se calhar não tem grafonola, mas creio que dentro de pouco tempo vai ser um exímio tocador de cavaquinho.
É alegre, bonacheirão, bom conversador e também sabe ouvir. Excelente amigo do seu amigo.
Escreve, com grande talento, histórias fabulosas e intrincadas.
Nunca falou mal da sogra nem de ninguém. Não canta, mas encanta-se ao ouvir quem canta.
Sabe que quando me perguntaram:
-"Então que tal?"
Eu respondi:
- Ahh...este fulano é o máximo...
Gostei muito desse botão de rosa!
Uma beijoca.
@Janita. Com estas palavras alguém já se está a babar. Por sinal também conheci este fim de semana uma pessoa que anda nas lides blogosferas mas que ao vivo e a cores é muito interessante. E olhe que em simpatia, ele que me perdooe se ler estas linhas, não fica nada, mesmo nadinha, a dever a esse seu amigo. Beijinho.
ResponderEliminarPS. Ele não fala mal de ninguém mas eu vou ser má língua. É verdade que ele tem pavor a cães, apesar de gostar imenso deles?
É verdade sim, Vitor! Pode acreditar.
ResponderEliminarSabe que esse meu amigo tem tanto, mas tanto pavor de cães que nem quis transpor o umbral da porta?
Mas pronto...lá se esqueceu que em caso de emergência poderia sempre afugentá-los a grito...a exemplo do já acontecido.
Veja no meu próximo post, a doçura de cachorro (na) que é a Blackie...e como ela gosta de futebol...
É sempre uma boa surpresa a sua escrita...
ResponderEliminar...e são (de)lirios brancos estes que te deixo..ao invés de uma rosa vermelha...
ResponderEliminarTão bom ...sentir que [ainda] existem MAGNÍFICOS e TALENTOSOS Prosistas.
Abraço-te
Gostava de encontrar muitos senhores Máximos na minha vida e tenho a certeza que ela seria bem mais colorida.
ResponderEliminarJá que não há tantos Máximos assim há alguém que escreve histórias que são o máximo.
Manu
Olá, Vitor!
ResponderEliminarEra o Máximo, com certeza!
Gente assim, não há muita, são quase que uma dádiva da natureza - e encontrá-los é um privilégio.
Bonita história, muito bem contada.
Um abraço amigo.
Vitor
Olá Vitor!
ResponderEliminarTudo bem por aí? Espero que sim!
Não se esqueça que o pessoal está esperando pelas suas empolgantes histórias. Força!
Beijinhos.
Só mesmo num texto seu para encontrarmos um Sr Máximo, Vítor Fernandes!
ResponderEliminar;)
O Sr. Máximo, máximo ficou no epitáfio que levou..
ResponderEliminar"estórias" de encantar...ah!
Um beijinho daqui...
Assiria