Noutros tempos a gente escrevia de uma maneira diferente. Colocávamos dois eles na palavra ella, escrevíamos cousas em vez de coisas e até o nosso Eça, era Queiroz em vez de Queirós. Isto para não falar que quem ia a Chang-Hai ia exatamente ao mesmo sítio de quem hoje vai a Xangai. Ou poderíamos mesmo dizer que quem fosse a uma pharmacia comprar uma uncção a poderia espalhar na pele ao mesmo rhythmo com o que faria hoje. E se estas formas de escrever não atrapalhavam a oralidade, muito menos atrapalha quem atualmente decidiu adotar o acordo ortográfico feito com os outros países que falam a língua de Camões. Falam-na, não têm forçosamente que a escrever, pois se assim fosse estaríamos a escrever à moda do século XVI.
Esta introdução vai longa e não adiantou nem atrasou quase nada à história que vos quero contar hoje e que não é exatamente uma história para se escrever mas sim uma história para se contar. Resume-se a história ao jeito do nosso povo dizer as coisas pois, do Minho ao Algarve, se encontram por todo lado genuinidades linguísticas. Conto-vos então que a minha avó materna, saudosa avó acrescento, dizia ela que quando chegava, tinha avonde e a avó da minha mulher não fazia o café na cafeteira mas sim na escolateira (chocolateira, seria) e qualquer aparelho, para ela, era um tarrasso. Hoje em dia existem já publicados vários livros com palavras próprias de cada região que valem a pena ser lidos por quem for curioso destes regionalismos linguísticos.
Mas muito mais interessantes do que as palavras isoladas são as expressões que as utilizam ou como são verbalizadas, não me referindo propriamente às expressões idiomáticas, mas sim mais ao jeito que cada um tem para dizer coisas simples, para se fazer entender. Um amigo meu, já idoso, quando lhe perguntamos então como é que isso vai ti Joaquim?, ele responde-nos, estou aqui até que o enterrador queira. Digam cá se não tem magia? Era a esta magia do dizer que eu queria chegar com toda a retórica supra. Há uns anos atrás, quando o meu filho, ainda petiz, quis encher a garrafa de água no chafariz que estava ali mesmo à mão, o ti Chico pescador logo o desincentivou. Apontou-lhe um outro chafariz, que ficava distante daquele uns bons cem metros, que para a criança deveriam parecer mil, e explicou-lhe, enche antes daquela; esta também é boa, mas na presta. E claro que percebemos perfeitamente o que ele queria dizer.
Esta introdução vai longa e não adiantou nem atrasou quase nada à história que vos quero contar hoje e que não é exatamente uma história para se escrever mas sim uma história para se contar. Resume-se a história ao jeito do nosso povo dizer as coisas pois, do Minho ao Algarve, se encontram por todo lado genuinidades linguísticas. Conto-vos então que a minha avó materna, saudosa avó acrescento, dizia ela que quando chegava, tinha avonde e a avó da minha mulher não fazia o café na cafeteira mas sim na escolateira (chocolateira, seria) e qualquer aparelho, para ela, era um tarrasso. Hoje em dia existem já publicados vários livros com palavras próprias de cada região que valem a pena ser lidos por quem for curioso destes regionalismos linguísticos.
Mas muito mais interessantes do que as palavras isoladas são as expressões que as utilizam ou como são verbalizadas, não me referindo propriamente às expressões idiomáticas, mas sim mais ao jeito que cada um tem para dizer coisas simples, para se fazer entender. Um amigo meu, já idoso, quando lhe perguntamos então como é que isso vai ti Joaquim?, ele responde-nos, estou aqui até que o enterrador queira. Digam cá se não tem magia? Era a esta magia do dizer que eu queria chegar com toda a retórica supra. Há uns anos atrás, quando o meu filho, ainda petiz, quis encher a garrafa de água no chafariz que estava ali mesmo à mão, o ti Chico pescador logo o desincentivou. Apontou-lhe um outro chafariz, que ficava distante daquele uns bons cem metros, que para a criança deveriam parecer mil, e explicou-lhe, enche antes daquela; esta também é boa, mas na presta. E claro que percebemos perfeitamente o que ele queria dizer.
Com tanta simplificação e acordos estamos a perder a essência da nossa língua.
ResponderEliminarbjs
E como é delicioso ouvir essas versões:) e sobretudo alentejanas.
ResponderEliminarAqui há várias pessoas que não esquecem as suas raízes e farto-me de rir quando as oiças e toma esta por troca:
no Centro de Saúde: então menina não vêee que na pago essa da tralha duradoira lollll
Depois do discurso do no 1º. Ministro só tu me fazias rir:)
Gosto dos regionalismos linguísticos ou não fosse algarvia marafada :))
ResponderEliminarVocês nem imaginem como essa conversa é interessante para mim, que sou brasileira! Pena que não entendo tudo....
ResponderEliminarAs nossas memórias devem ser conservadas.
ResponderEliminarA forma como as transmitimos é indiferente.
Querido amigo Constantino.
ResponderEliminarEste seu excelente texto veio deixar esta minha pobre cabeça ainda mais confusa do que ela já estava. Tanto, que não sei se lhe diga, que ele veio cair como sopa no mel ou se lhe diga que veio dar razão àquele provérbio, atribuído aos sacerdotes, que sendo seres humanos como outros quaisquer e portanto sujeitos a errar, têm por obrigação pregar sobre a moral e os bons costumes.
Não vem isto a propósito da evolução da nossa Língua, através dos tempos nem sequer do recente acordo ortográfico, abolidor das letras mortas e pondo-nos em pé de igualdade com os nossos irmãos de além Atlântico, cuja terra discoberta por Cabrau foi inicialmente colonizada por alentejanos. Daí, a utilização dos verbos no gerúndio ainda hoje lá estarem, fortemente arreigados.
Bem, antes que me perca daquilo que me confundiu, vou já directa ao assunto. Continuando a ser a nossa Língua tão rica em expressões linguísticas, como o meu amigo nos provou o bastante ou avondo ( não avonde) fiquei deveras surpreendida quando li, algures, uma expressão em que se pretendia classificar a actuação de certos meninos d`ouro, como desastrosa – penso eu de que - e se utiliza para tal um termo ( por mim, nunca antes ouvido ) de um tipo de excremento humano com visão.
Não quero com isto dizer que tal expressão não possa estar certa e não tenha até o seu cunho pitoresco, regionalista e seja boa, mas dito por quem…na presta.
Peço-lhe, encarecidamente, que se algo aqui estiver errado dada a minha pouca sabedoria em linguajares e quejandos, bem como a minha proverbial falta de comedimento e, sobretudo, de perspicácia, não se coíba de me corrigir.
Só não resisti a falar-lhe nisto, porque a falar é que a gente se entende, na é?
Beijocas.
Janita
Delicioso final, numa história como sempre bem urdida.
ResponderEliminarTambém gosto de regionalismos e foi por isso que criei lá no CR a "Pronúncia do Norte", uma secção do meu dicionário.
Abraço e bom fds
Vamos então por partes, minha querida amiga, Janita.
ResponderEliminarTal como escrevi "na presta", em vez de "não presta", terei escrito "avonde" em vez de "avondo". É que a minha avó era algarvia, de Silves, e ainda ao fim de viver 60 anos aqui em Almada e Cova da Piedade dizia, figue, avonde, merle (melro), pau de fi(o) e outras algaraviadas deliciosas que parece que a estou a ouvir.
A segunda, a dos futebolistas serem classificados como excrementos rijos com orgãos de visão e que eu, no meu vernáculo, traduzi como cagalhões com olhos, no FB, não lhe conheço a origem regional, mas para quem os viu jogar este teria sido o epíteto ou a expressão mais simpática. Olhe que eu já li sobre eles outros regionalismo que me coíbo de reproduzir.
Um ósculo e um amplexo e que tenha um ótimo fim de semana.
Ora bem, meu querido amigo,
ResponderEliminareu a usar de toda a diplomacia e afinal vejo que nem precisava. Vou apenas fazer um ligeiro acrescento quanto aos locais aonde eu li essa sua expressão. A outra, foi no blog de um amigo. Ah, essa sua apetência por queijo...
Quanto ao "avondo" ou "avonde" pensei que tivesse intuído ter sido isso mero tema de conversa, sem qualquer intenção de o criticar. Aliás, nem sequer no tema supra referido.
Mas porque não farei eu como a maioria dos/as comentaristas e me limito a dizer que gostei muito, sem me alongar com opiniões próprias...?
Há coisas em mim, que por muito que leve nas orelhas nunca vão mudar.
Se calhar tenho tendência para o masoquismo.
Um forte amplexo, dois ósculos e tenha também um óptimo fim-de-semana.
@Janita,
ResponderEliminarFico-lhe a dever um ósculo.
É curioso como algumas maneiras de falar nos ficam rapidamente no ouvido e outras parece que os arranham... :)
ResponderEliminarExistem também outras palavras, que noutros tempos eram muito usadas e hoje caíram em desuso e tornando-se até desconhecidas da maioria da população. As línguas vivas têm destas coisas... :D
Beijocas!
E que mais poderei acrescentar que não foi já dito?
ResponderEliminarUm texto claro e cativante e uma troca de comentários igualmente interessante. : )
Só as línguas mortas é que não sofrem alterações, pois é através da corrupção da língua falada que a escrita se altera.
ResponderEliminarNo fundo esta questão do acordo ortográfico talvez tenha tido maior relevância porque, primeiro há sempre a tendência para resistirmos à mudança e segundo porque, apesar de passarmos metade da vida a amaldiçoar "a Pátria que não nos merece", também gostamos de alardear o sentimento patriótico, mesmo quando se trata da língua que nós tratamos tão mal, ou pior, do que os brasileiros.
"Prontes", era só para dizer isto e dizer também que, apesar de algum patriotismo bacoco, tenho a consciência de que não é a minha oposição que vai impedir o Mundo de mudar. Assim já tratei de configurar o corrector ortográfico do Word, onde escrevo os textos mais longos (comentários ainda não lol), já com a devida correcção.
@Mim e que tal umas dicazitas de como se faz essa configuração?
ResponderEliminarPois que aquelas expressões deliciosas da sua avó Algarvia, também as tinha a minha saudosa Tia que vivia lá nos montes da Serra de Serpa, onde passei muitas das minhas férias de criança e adolescente. Variava o sotaque é claro, mas o sentido era o mesmo...
ResponderEliminarQuanto ao Acordo, tenho mesmo muita dificuldade em respeitar o dito. Enquanto der vou continuar a escrever como aprendi. Depois ... lá terei que reaprender. Com tempo, que isto das pressas não faz bem a ninguém :)
Para o Office 2010
ResponderEliminarCom um documento Word aberto:
Ficheiro
Opções
Verificação
Dicionários personalizados
Modos de português de Portugal.
Pós-acordo
Pre-acordo
Ambos
É só escolher.
Office 2007 faz-se AQUI o download do ficheiro.
gosto muito de regionalismos linguísticos,e gostava de saber mais do que aquilo que sei acerca deste tema.
ResponderEliminargostei do seu texto,muito oportuno.
não gosto do novo acordo ortográfico.
beij
Obrigada Vitor!
ResponderEliminarSó espero que nunca tenha entendido nada daquilo que eu lhe tenha dito - algo, quiçá, menos agradável- como ofensivo.
Felizmente eu não tenho tido ofensas, apenas coisas menos agradáveis.
Pois é, sou alentejana sim senhor!
Talvez por isso, tal como os algarvios, seja também um pouco marafada.:))
Beijinhos.
AI CONStantino, já te passou a infecção? já se pode penetrar sem medo?
ResponderEliminarkis :=)