quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

248. O dono da bola - #17. O interturmas na Universidade



Foi um jogo histórico. Era o último jogo da fase de grupos e bastava-nos uma vitória. Qualquer que fosse o resultado pois 1 a 0 já era o suficiente e seguiríamos em frente. Era o nosso último ano no Técnico e nunca a nossa equipa tinha passado em primeiro lugar a fase de grupos. Era aquela a nossa grande chance e logo contra, se não a mais fraca, uma das mais fracas equipas do torneio. Tínhamos ganho, até com surpresa,

a Providência Divina, nunca ouviste falar? Parece que não…

a outras que não esperávamos, mas naquela altura até jogávamos bem, tínhamos uma boa linha. Começamos logo a carregar. Alugávamos o nosso meio campo nem que fosse para fazer uma feira.

nunca se saíram bem os vendilhões do Templo…

Os tipos nem tocavam na redondinha. As oportunidades surgiam atrás de oportunidades e o golo estava eminente. A confiança era enorme. O nosso guarda-redes era um mero espectador.

!fia-te na Virgem, fia-te na Virgem e não corras e vais ver onde vais parar!

Fizemos deles gato-sapato até que, uma bola perdida, um pontapé para a frente apanhando-nos em contrapé e toma lá que é para aprenderes,

eu não digo, eu não digo?...

os gajos marcam um golo. Estávamos a perder por um a zero mas isso não nos afetou o ânimo.

isso dizes tu. Faço ideia a tremedeira que por lá ia…

Em cada bola que chutávamos parecíamos querer explodir num tremendo grito de golo. Mas a bola teimava em queimar os postes ou o guarda-redes deles defendia tudo e quando não era ele a defender as bolas bateriam num defesa.

- E agora já acreditas na Providência Divina?
- Eu nunca deixei de acreditar…
- Ah não?
- Não. Só não percebo ainda porque é que fomos desprotegidos!

Até que às tantas, penalti! Penalti a nosso favor, ainda havia tempo. A segunda-parte tinha começado agora mesmo. A recuperação era possível. O Jorge foi marcar e… falhou.

entraram em campo sobranceiros, só podia ser. Sabes o que é humildade?

Deceção total. Tinha sido naquele momento ou nunca. Qual nunca, qual quê!

- Neste aspeto tens razão. A esperança é sempre a última a morrer
-Deixas-me acabar a história, ou não?
- Acaba lá. Mas olha que estou com um mau pressentimento
- És um agoiro!

Vamos mas é ganhar isto! Vamos? E continuamos a mandar bolas aos postes, outras salvas in extremis, o tempo a passar e acabamos o jogo perdendo por um a zero. Caímos exaustos no chão. Foi ali o meu último jogo num torneio interno do Técnico. Era o meu 5º ano e algumas semanas mais tarde terminaria o curso.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

247. O dono da bola - #16. Um autocarro em frente da baliza


O título deste texto apresenta uma expressão que se tornou popular no mundo do futebol. O seu significado é o de que uma equipa se coloca numa atitude tão defensiva, que os seus elementos ocupam todos os caminhos de acesso à própria baliza. Isto nem seria assim tão errado, poderia mesmo querer dizer que a equipa defendia muito bem se, por acaso, isso não significasse também o abdicar quase por completo de efetuar jogadas ofensivas.

Ó Pá, não te vais agora aqui pôr a explicar táticas de futebol. Os teus leitores querem ler histórias e não tretas.

A nossa equipa no interturmas da Escola Náutica não defendia bem. Também não defendia mal. A nossa Quiaios Team não defendia nada! Ele era cada tareia que tirava a barriguinha de misérias a cada equipa que nos defrontasse. Mas naquele dia, não! Naquele dia, tudo iria ser diferente.

Então vá lá, qual foi a tática?

Durante toda a semana se ouvia falar que era desta vez que íamos levar trinta. Como se fosse um jogo de andebol. Íamos jogar contra a melhor equipa do torneio. Já a nossa equipa de craques, a primeira equipa da turma, aquela de que vos falei no episódio anterior, já essa tinha sido esmagada. Agora iria ser a degola dos inocentes. Nem íamos sair do meio-campo. E pronto, é verdade, praticamente não saímos.

Ah não? Isso é que é tática? Agora sou mesmo todo ouvidos. Mas despacha-te que não tenho o dia todo…

O Rui falou com a malta. Não se usava ainda a expressão “meter um autocarro em frente da baliza”. Nem nós eramos camioneta para tanta areia. Então o melhor era esperar, mas não tão perto assim da área, obrigando-os, se quisessem, a rematar de longe e nós nunca descompensarmos. Bola cortada, era pontapé para a frente. Eles que corressem, haveriam de estoirar de cansaço. E o pessoal se perdesse por um ou dois já era como se fosse derrota para eles. Eu ouvi, mas não calei. Logo eu que só gosto de marcar golos. Defender para mim tem de ser de circunstância. O meu lugar é na frente a marcar golos. Se eu levasse uma bolada de um daqueles, levezinho como era, até dava meia volta no ar… Mas tem de ser, dizia o Rui. Se não tínhamos nenhuma chance de lhes ganhar, então também não serviríamos de chacota.

Resultou?

Por duas vezes que não recuperei. Ou porque me esquecia de ir mais atrás, ou porque a minha rotina não era aquela, ou porque a minha maneira de ser era outra, que se lixasse se levássemos dez ou trinta, era perder na mesma. E tal como os pensamentos voam também as bolas e, por duas vezes, ela me saltou na frente, eu sozinho no meio campo adversário apesar do mau estar e, reconheço, falta de solidariedade para com os meus colegas lá atrás, a levarem com a artilharia “inimiga” toda em cima. E ah! Pernas para que vos quero, bola tentadora e enquanto o “treinador” gritava, Chuta pra fora e recua!,  lá fui eu a correr direito à baliza adversária, uma das vezes desarmado in extremis e outra vez com um pontapé disparatado para as nuvens.

Ena, o que vai para aí de sofrimento e frustração…

Ele há pensamentos que ultrapassam os timings da narração. Mas a verdade é que esse foi um dos jogos mais frustrantes da minha “carreira”.  Perdemos por poucos, eu só joguei meia parte, desisti ao intervalo, não tive estofo para aquilo, o meu estômago não me deixava, era a revolta dentro de mim. Eu já não seria útil no segundo tempo. E foi verdade, não fui preciso para nada. Perdemos por poucos.